Duda, empresário minerador novato, um homem de sorte
19/12/07
Anna Carolina Negri / Valor
Edson Duda, no escritório da Mhag em uma cobertura no bairro paulistano do Itaim: “Estou vivendo momento mágico”Edson Duda é um apaixonado por barcos. A vela ou a motor, grandes ou pequenos. E foi essa sua paixão, aliada a uma interferência do acaso, que o colocou na trilha de um grande negócio anos atrás. Este homem risonho, de 52 anos, que aparenta ser mais baixo do que os seus 1,72 metro de altura e cujas feições lembram as do ator americano Danny De Vito, está sentado hoje sobre uma reserva de minério de ferro que, se estivesse toda disponível para venda imediata, valeria espantosos US$ 150 bilhões aos preços de mercado atuais (tecnicamente, as contas não são tão simples).Ele é o dono da Mhag Mineração, uma novata que ainda engatinha nesse ramo, que se tornou um dos melhores filões de negócios do mundo nos últimos anos depois das sucessivas altas do metal. Qualquer um que tenha uma mina de ferro na atualidade, em qualquer canto do planeta, pode se considerar um homem de sorte. Duda, com recursos minerais indicados de 3,77 bilhões de toneladas no Nordeste brasileiro, é um homem de muita sorte.Duda conta que, em 2003, uma grande mineradora australiana – uma das três gigantes do setor, ele pede para não citá-la nominalmente por serem “do mesmo ramo agora” – estava muito interessada em adquirir uma área no Porto de Santos. Um amigo de Duda tinha um terreno na zona portuária e, para poder mostrar aos executivos do grupo estrangeiro a propriedade, pediu emprestado o seu barco. Duda não só cedeu a lancha como juntou-se ao grupo no passeio. Ao fim da jornada, a venda do terreno não vingou, mas Duda desembarcou com o apetite aguçado pela mineração de ferro, depois de tantas conversas com os representantes do grupo australiano. A partir daí passou a prestar mais atenção ao noticiário do setor e percebeu que a demanda mundial só fazia crescer, puxada, principalmente, pelo consumo chinês.No ano seguinte, uma consultoria lhe apresentou a oportunidade de comprar uma pequena fatia de uma desconhecida mineradora, a Mhag. Os sócios, brasileiros, precisavam de dinheiro para desenvolver a mina e procuravam um parceiro. Duda resolveu arriscar e comprou 15% do negócio. Isso foi em 2004. Logo depois, em 2005, o ferro teve a sua primeira grande alta, de 71,5%. E não parou mais.Nem Duda parou. Conforme crescia a necessidade de capital da Mhag e os sócios originais não dispunham de recursos, ele ampliou sua participação e passou a controlar a empresa. Quando pôde, arrematou o restante. No total, diz ter investido cerca de US$ 80 milhões. Em julho deste ano, a sua Mhag foi avaliada por algumas centenas de milhões, quando a trading de Hong Kong Noble Group pagou R$ 112 milhões para ficar com 30% da companhia.Entre outros negócios, a trading, que é listada na bolsa de Cingapura e fatura US$ 20 bilhões por ano, gerencia uma frota de 180 navios. Esse foi um dos fatores que pesou a favor da Noble, entre outros cinco interessados. Frete marítimo é um artigo escasso e caro na atualidade. O dinheiro do Noble foi usado para aumentar o capital da empresa e investir em logística.O valor pago pelo grupo chinês ainda é tímido perto do que pode estar por vir. Duda, ao lado dos executivos da Noble, trabalham para levar a empresa à bolsa de valores no quarto trimestre de 2008. Segundo apurou o Valor, cálculos preliminares feitos por bancos de investimentos interessados nesse contrato indicaram que a empresa valeria hoje cerca de US$ 5 bilhões. Duda não comenta.Em sua infância em São Caetano, na Grande São Paulo, Edson Duda, filho de um operário do ABC paulista, não poderia sonhar tão alto. E, ainda agora, custa a acreditar. “Estou vivendo um momento mágico.” Ele não saiu do nada para tornar-se um mini-magnata do ferro do dia para a noite. Formado em administração de empresas, Duda iniciou a vida profissional na área comercial da Shell. E foi pela multinacional de petróleo que acabou transferido para Curitiba, no Paraná. Aos 28 anos desligou-se da empresa e iniciou sua “carreira” como empreendedor. O primeiro negócio foi um posto de gasolina. Ele mantém uma rede de oito postos, todos rodoviários e nos arredores de Ponta Grossa e Curitiba.O empresário tem ainda 30% de uma indústria química que produz e distribui tintas. Ele e a mulher Natalina possuem também duas fazendas voltadas para agropecuária e reflorestamento. A sua holding Campina era dona de três projetos de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), já autorizados pelo Ibama. Foi com a venda desses direitos que ele levantou dinheiro para iniciar sua incursão no mundo da mineração.O caminho de Duda no setor mal começou. “A Mhag é uma empresa que, neste momento, está apenas no início”, pondera, em português, Elliot Spitz, vice-presidente executivo do Noble Group. Ele morou no Rio de Janeiro por quatro anos na década de 80 e é um apaixonado pelo Brasil. Pela familiaridade com o país, foi o executivo destacado para avaliar o potencial do investimento quando a oportunidade se apresentou no primeiro semestre do ano. O Noble foi assessorado pelo Citi.Antes de fazer sua proposta, Spitz visitou a mina de Jucurutu, no Rio Grande do Norte, a operação de Juazeirinho (Paraíba), onde o minério é transferido para a rede da Companhia Ferroviária do Nordeste, e também as instalações no porto de Suape, no Ceará, por onde é escoada a exportação atual. “Deu para ver que o negócio era real e com potencial muito grande.”Agora, todos os esforços da Noble estão voltados para ajudar Duda, sua esposa Natalina e o cunhado Pio Sacchi, que preside a empresa, a desenvolver esse potencial, diz Spitz. Hoje, a Mhag produz apenas 3,6 milhões de toneladas ao ano, exportadas para a China para clientes da Noble. Pio Sacchi diz que os planos contemplam produção de 30 a 35 milhões de toneladas anuais até 2011. Mas Spitz vai além. “As reservas permitem mais e temos a ambição de chegar a extrair 50 a 100 milhões de toneladas, o que colocaria a Mhag no segundo time de mineradoras, atrás de Vale, BHP e Rio Tinto.”Levará alguns anos até que a Mhag atinja o porte esperado, mas a avaliação do Noble Group é que o mercado continuará aquecido e pronto para absorver a produção.A empresa tem três blocos de jazidas: Jucurutu (600 milhões de toneladas), São Mamede (1,3 bilhão de toneladas) e Cruzeta (1,7 bilhão de toneladas). Apenas Jucurutu está produzindo e ainda em esquema artesanal. Ao todo, são 220 pessoas trabalhando, sendo 85 funcionários próprios.A Mhag opera com processamento do chamado sinter feed (fino), que é um produto com maior teor de ferro. Mas a grande vocação das jazidas, de acordo com Sacchi, é para pellet feed, com a menor concentração do minério.Para que a Mhag deixe de ser um projeto, além de erguer instalações de processamento de pellet feed nos três blocos de jazidas, será preciso construir uma pelotizadora (com capacidade de 5 milhões de toneladas anuais) e melhorar a logística, hoje improvisada (ver reportagem nesta página). O bloco de Jucurutu está a apenas 125 quilômetros do mar e a idéia é construir um novo porto no litoral potiguar, batizado de Mangue. Para levar o minério até lá, será preciso um mineroduto. Com isso, a produção de Cruzeta e Jucurutu poderão ser escoadas por esse novo sistema logístico, muito mais econômico. Essa seria uma grande vantagem competitiva da Mhag. “Nenhuma mina deste porte está tão próxima do mar”, diz Duda.Todas essas obras foram orçadas, preliminarmente, em US$ 1,6 bilhão. Estão em fase de contratação empresas de consultoria, engenharia e mineração que revisarão e aprofundarão todos os projetos feitos até agora. Os estudos de viabilidade das obras devem ser concluídos até julho, diz Spitz.Os planos vão demandar muito dinheiro – que virá por meio de emissão de ações e tomada de dívida – e também talentos. A Mhag, com auxílio da Noble, está em fase de contratação de um presidente e diretores. A idéia é profissionalizar toda a gestão. A família ficará apenas no conselho de administração, hoje já presidido por Duda.Antes de partir para a abertura de capital, a Mhag pretende ter boa parte das reservas devidamente provadas por auditorias internacionais, para confirmar o potencial dos recursos apontado até hoje. “Não tenho o sobrenome Batista e meu pai não presidiu a Vale do Rio Doce”, brinca Duda, numa clara referência ao empresário Eike Batista, filho de Eliezer Batista, que abriu o capital da sua bilionária MMX sem ter as reservas medidas.
Valor Econômico