MST interdita ferrovia de Carajás e Vale deixa escoar 250 mil toneladas de minério de ferro por dia
18/10/07
A Estrada de Ferro de Carajás (EFC), que transporta diariamente cerca de 1.300 passageiros, 250 mil toneladas de minério de ferro em 2.700 vagões e que abastece de combustível as cidades do sudeste do Pará, está com o tráfego interrompido desde a manhã desta quarta-feira (17) por um grupo de manifestantes, formado principalmente por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Havia várias versões sobre o número de manifestantes, variando de 1.500 a 3.000. Mas a Companhia Vale do Rio Doce, concessionária da ferrovia que liga as minas de Carajás ao porto da Ponta da Madeira, em São Luís do Maranhão, numa extensão de 892 quilômetros, informou que cerca de 300 pessoas estariam ocupando os trilhos da EFC. A interrupção é à altura nas vilas dos assentamentos Palmares I e II, no município de Parauapebas. Em nota à imprensa, a Vale diz que ?repudia, com veemência, atos criminosos como vandalismo, danos ao meio ambiente, ameaças a trabalhadores e violência em geral?. ?Além disso, a ocupação da ferrovia e a conseqüente paralisação das operações da Companhia causam prejuízos financeiros para o país, com a interrupção de exportações, além de comprometer a imagem das empresas brasileiras diante de clientes de todo o mundo?, diz a nota. A Vale informa que a Polícia Militar do Estado do Pará já foi notificada, mas que até o final da tarde desta quarta-feira ?nenhuma providência havia sido tomada para que a ferrovia fosse liberada?. Segundo a empresa, os manifestantes estavam se preparando para um movimento de longa duração, usando tratores para transportar para o local grande quantidade de alimentos, material para acampamento e utensílios. Ela lembra que há dez dias informou à Justiça Federal de 1ª instância a ameaça de invasão. ?No dia 8, a Justiça concedeu uma liminar de interdito proibitório, proibindo qualquer ato atentatório contra a EFC e estabelecendo multa diária no valor individual de R$ 100 reais. O juiz Arthur Pinheiro Chaves autorizou, ainda, requisição de reforço policial para a execução da ordem, oficiando a Polícia Federal e a Polícia Militar para que dessem auxílio ao aparato da Polícia Judiciária Federal para o cumprimento da diligência?, afirma. De acordo com a nota, no último dia 15 a intimação da Justiça Federal foi entregue aos responsáveis pelo movimento. A Vale garante ter alertado sobre a ameaça de invasão todas as autoridades estaduais e federais. Por medida de segurança, a empresa suspendeu o transporte de passageiros, tanto no Pará quanto no Maranhão, ?uma vez que os manifestantes apedrejaram uma composição, pondo em risco a vida de passageiros e de funcionários?. A Vale observa que a suspensão prejudica principalmente a população maranhense, uma vez que, dos 23 municípios servidos pelo trem, 20 ficam no Maranhão e, muitas vezes, não há opção de estradas. Além de afetar a exportação de minério de ferro produzido em Carajás, além de outros minérios, como cobre e manganês, a paralisação dos trens prejudica também o abastecimento da usina de pelotização instalada na região de São Luís. De acordo com a Vale, a partir do segundo dia da interdição, a usina, que produz seis milhões de toneladas de pelotas por ano, não terá mais matéria-prima para produção. ?A CVRD espera que as autoridades tomem, o mais rapidamente possível, as providências necessárias para pôr fim à invasão, e destaca sua perplexidade por ser alvo de manifestantes que apresentam reivindicações que não têm qualquer vínculo com a Companhia, como a ?defesa da reforma agrária e protesto contra o imperalismo??, acrescenta a Vale. Manifesto O documento distribuído pelos manifestantes é assinado, além do MST, por grupos como a Via Campesina, o Sindicato dos Garimpeiros de Serra Pelada e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), entre outros. É dirigido aos governos federal, estadual e municipal e à Vale do Rio Doce e informa que a manifestação faz parte da luta pela reforma agrária e em defesa dos recursos naturais. Os manifestantes pedem a reestatização da Vale e que a governadora Ana Julia Carepa ?assuma uma outra postura? em relação à empresa, articulando uma frente de estados mineradores onde a CVRD atua, ?para que seja construído um novo imposto sobre a mineração e ao mesmo tempo estabeleça uma campanha para o fim da lei Kandir que beneficia apenas as empresas exportadoras?. É pedido também o aumento da CFEM ( Contribuição Financeira pela Exploração Mineral), de 4% para até 10% ?de toda a riqueza produzida?. O documento solicita ainda que a Vale suspenda o fornecimento de minério de ferro para as siderúrgicas da região ?que não cumpram responsabilidade ambiental e social?. Pede também a construção de moradias populares, postos de saúde e hospitais, a erradicação do analfabetismo, o acesso à universidade pública e segurança social. O documento inclui reivindicações dos garimpeiros de Serra Pelada e o julgamento imediato dos processos trabalhistas que envolvam a Vale. Outra reivindicação é para a criação de um Conselho Deliberativo com representantes do Estado, da CVRD e da sociedade civil ?para discutir e deliberar sobre os projetos de mineração e de uso de recursos ambientais da região?, além da realização de um amplo programa de reforma agrária na região. E mais, que a Vale ?estabeleça junto com os movimentos sociais uma agenda para discussão de todos os projetos minerais já implantados e a serem implantados na região?. Neuza Sales, integrante do MST, em notícia distribuída pela Agência Brasil, afirma que não há previsão para desocupação da ferrovia. De acordo com ela, isso dependerá das negociações e do atendimento das reivindicações dos manifestantes. A assessoria da Polícia Federal informou que ainda está estudando como vai proceder em relação à invasão. Como a estrada é uma concessão do governo federal, cabe à PF interceder na situação. Policiais militares do Pará foram ao local e monitoram a interdição. De acordo com nota no blog do jornalista Hiroshi Bogéa nesta quarta-feira, o clima em Parauapebas estava tenso. ?Os donos de lojas comerciais não fecharam suas portas como se chegou a anunciar, mas funcionam sob estado de apreensão diante dos boatos de que o MST iria promover quebradeira na cidade. Os rumores maiores, desde o inicio da semana, davam conta de que a agencia local do Bradesco seria depredada pelos manifestantes durante marchas realizadas nas vias publicas?. ?O deslocamento, hoje cedo, de grande parte da militância do MST para o local onde a Estrada de Ferro Carajás foi ocupada amenizou mais o ar. A harmonia normal da cidade, no entanto, vai demorar a ser restabelecida, caso se prolongue a programação da jornada de luta pela reforma agrária oficializada pelos líderes dos sem-terra. Próximo ao ?cenário de batalha?, o blog registrou milhares de pessoas assentadas nos trilhos da estrada de ferro. Cálculos pessimistas feitos por um oficial da PM que se encontrava à paisana no local indicam em torno de três mil manifestantes, entre adultos e crianças, de ambos os sexos, falando a mesma linguagem de críticas aos governos federal e estadual e de insultos à Companhia Vale do Rio Doce. A ira do MST lançada contra a mineradora nunca tinha antes atingido tons tão elevados. Escolhida como alvo principal das palavras de ordem, a agencia do Bradesco simboliza, na visão do movimento, a maioria acionária da instituição dentro da atual estrutura administrativa da CVRD. Até às 11h35, quando o blogger deixou o local, não havia entre os ocupantes dos trilhos nenhuma expectativa quanto o tempo de permanência na ferrovia?, informava Bogéa.
Pará Negócios